13 de março de 2011

Considerações sobre a existência - I

Ontem escrevi: «Odeio já não conhecer a solidão».

Estava errada, completamente errada. Na verdade, eu nunca a conheci. O bulício das multidões, as mil e quinhentas conversas ao mesmo tempo e os encontrões em que as peles se ousam tocar tornaram-se uma adição incontrolável.

Se não há som ou toque humano que se entranhe em mim, então é um dia perdido. Um dia inexistente. Um dia em que só tive acesso à decomposição fétida da minha finitude. Já não sei respeitar o silêncio ou a ausência: o sangue quente dos que me rodeiam é o meu alimento. A vibração das suas vozes, o ondular dos seus cabelos e a energia das suas mãos passaram a ser as minhas primeiras necessidades. Há que sugar cada movimento, cada rosto enrubescido, cada troca de olhares.

Não há nada mais belo do que uma amálgama de corpos que se roçam, que ousam experimentar,nem que seja por breves instantes, a pele uns dos outros. Nessa fracção de segundos – ao entrar no comboio, ao entregar o dinheiro ao funcionário da loja, no primeiro contacto sexual – a matéria ganha finalmente sentido: fomos dotados de uma parte física para nos tocarmos, para nos avisarmos mutuamente de que existimos. É graças aos outros que existo: sem este toque, este breve instante, eu nada seria, uma vez que este toque me alerta para o facto de estar aqui, de estar viva.

Ainda que seja ilusório, que continuemos a ser tão solitários como se estivéssemos completamente isolados, os outros fazem questão de nos assegurar a maior das nossas tormentas: existimos, efectivamente.

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