30 de agosto de 2009

Utopia


O meu dia hoje foi perfeito. Acordei com o cantar do galo na minha caminha, cheia de baba nos cantinhos dos lábios, entre duas pessoas que se tinham aninhado no conforto da minha barriga durante a noite passada.

Sem os acordar aquelas duas carinhas esborrachadas contra os lençóis, fui espremer umas laranjas e preparei-lhes um pequeno-almoço com o sumo das ditas rodelas cor-de-laranja e uns croissants bem fofinhos. De seguida, atirei-lhes um balde de água e eles, num misto de felicidade e de raiva por os ter desfeito de sonhos cor-de-rosa, decidiram iniciar uma guerra de almofadas. Após ter comido umas penas, lá fiz o rapaz e a rapariga ingerirem aquela deliciosa refeição.

O passo seguinte foi o visionamento de um filme qualquer que tínhamos lá por casa. A película não valia nada, mas mesmo assim ecoaram gargalhadas pela divisão apenas constituída pelo colchão, o televisor e o VHS. Os miminhos, os beijos, as pipocas sem sal nem açúcar, soube tudo tão bem!

O almoço foi uma tarefa complicada: três latas de atum, um pacote de maionese, as ditas laranjas, e um pacote de batatas fritas cujo prazo já tinha sido ultrapassado em cerca de cinco dias. Nem queiram saber como aquilo ficou.

Para disfarçar o tão desejável ócio de uma tarde de Verão, mal o calor atenuou um pouco, decidimos pintar parte de um muro velho que cercava a moradia onde estávamos alojados. Ele pegou na lata de azul ciano, ela na amarela, eu na magenta. Ficou tudo menos bem pintada! Eu preocupava-me mais em fazer pinturas tribais na cara dos meus companheiros, ela divertia-se a mergulhar as mãos nos baldes e a deixar no dito muro a sua marca, ele tivera um súbito ataque de arte abstracta. Por fim já nem sabia de que cor era a minha pele.

Sujos, suados, exaustos, corremos até à praia (que não distava muito da casa) e mergulhámos de imediato naquelas águas tocadas pelo reflexo do pôr-do-sol. De pouco me lembro deste fragmento do dia, pois quando dei por mim estava sentada à beira-mar, um pouco triste, com a cabeça enfiada entre os joelhos, enquanto eles se divertiam a fazer castelos de areia. Sorri. Não tinha razão para estar infeliz. Até me emocionei ao vê-los ali, perto de mim, felizes, como duas crianças inocentes. Quando se lembraram que eu estava ali como que inanimada, atiraram-me areia, fizeram-me de croquete, atiraram-me à água e o momento mais espiritual do dia desvaneceu-se por completo.

Depois dos duches tomados, da pizza encomendada, e dos copos lavados (sim, não havia muita mais loiça para tratar!), entregámo-nos uns aos outros. Sem medos, sem preconceitos, sem complexos, apenas com o amor puro, simples, primitivo, o nosso amor.

O excelente final de um dia que nem sequer existiu.

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